A diretoria da OAB/MT e a Comissão de Direito Bancário e Securitário encaminharam consulta ao TJMT para buscar a validação de recibo eletrônico como prova do preparo dos recursos visando atender aos artigos 73 e 74 do Regimento Interno do Tribunal que considera deserto recurso não preparado no prazo legal. O presidente da Seccional, Maurício Aude, e o presidente da referida comissão, Evandro Cesar A. dos Santos, apontaram a ausência de normatização por parte do Tribunal diante da falta de padronização do documento eletrônico emitido pelas instituições financeiras.
“Não se questiona o fato do recolhimento do preparo se caracterizar como um dos requisitos extrínsecos de admissibilidade do recurso. No entanto, na verdade, o que se pretende esclarecer é o meio pelo qual o recolhimento do preparo hábil a obstar o reconhecimento da deserção poderá ser efetivado”, pontuaram. Os advogados justificaram ao TJMT que não se pode olvidar o fato de que tais regramentos encontram alicerce no caput do artigo 511 do Código de Processo Civil, qual seja: “No ato de interposição do recurso, o recorrente comprovará, quando exigido pela legislação pertinente, o respectivo preparo, inclusive porte de remessa e de retorno, sob pena de deserção”.
A comprovação do pagamento do preparo mediante a juntada de comprovante emitido via internet tem sido reiteradamente concretizada no meio judicial em julgados do próprio TJMT, tendo sua legitimidade declarada pelo Superior Tribunal de Justiça (REsp 1415790/SC, relatora a Ministra Nancy Andrighi). Evandro Santos explicou que apesar do TJMT aceitar esta espécie de pagamento, não há qualquer orientação emitida pela Corte a respeito. “Como exigível apenas se revela uma similitude entre a Guia de Recolhimento emitida pelo Poder Judiciário do Estado de Mato Grosso - Fundo de Apoio ao Judiciário “FUNAJURIS” - e o documento fornecido pela instituição financeira no que concerne aos dados, tais como, código de barras, litigantes, data de vencimento do título, valor recolhido e data do pagamento?”, questionaram.
Resposta do TJMT
A resposta à consulta foi emitida pelo desembargador presidente do TJMT Orlando de Almeida Perri (Protocolo nº 0118427/2014) reconhecendo que as transações bancárias por meio eletrônico constituem prática comum nos tempos atuais, dada a facilidade de acesso à internet. Assim, o magistrado pontuou o seguinte:
“a) O uso do recibo emitido eletronicamente por instituição financeira, como prova do preparo do recurso interposto, é válido e admissível para o fim a que se destina;
b) O recibo eletrônico deve estar acompanhado da guia de recolhimento
da taxa e do porte de remessa e retorno, quando exigido, para que tenha validade, a fim de que seja aferido o valor total do preparo;
c) Somente será admitido o recibo em que a data do lançamento efetuado na conta-corrente do responsável for anterior ou concomitante à data do protocolo do recurso;
d) Não deve ser admitido recibo de ‘agendamento’ de pagamento, salvo a hipótese de recurso interposto durante o plantão judiciário;”
Confira a íntegra do despacho do presidente do TJMT:
DEPARTAMENTO AUXILIAR DA PRESIDENCIA
PROTOCOLO N. 0118427/2014
CONSULTA N. 0118427-85.2014.811.0000 . CAPITAL
CONSULENTE: ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL
CONSULTADO: PRESIDENTE DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MATO GROSSO
O Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional de Mato Grosso, consulta esta Presidência sobre a possibilidade de o Tribunal de Justiça de Mato Grosso admitir que a prova do preparo dos recursos interpostos ocorra por meio de documento gerado eletronicamente, como forma de atender ao disposto nos arts. 73 e 74 do Regimento Interno e no art. 511 do Código de Processo Civil.
Justifica a consulta obtemperando que a Lei n. 11.419/2006, ao dispor sobre a informatização do processo judicial, validou a prática de atos processuais por meio eletrônico, evidenciando a possibilidade de que o preparo do recurso seja comprovado por recibo eletrônico.
Argumenta que não há nenhuma regra no ordenamento jurídico vigente que proíba tal prática e que o Superior Tribunal de Justiça tem entendimento firmado no sentido de admitir o documento eletrônico como meio de comprovação do preparo.
Aclarado seu intento, solicita orientação sobre a validade do recolhimento eletrônico, com o apontamento dos requisitos a serem observados, considerando: a) a ausência de padronização do documento eletrônico entre as instituições financeiras; b) o momento em que seria considerado válido o recolhimento, dada a possibilidade de agendamento do pagamento e a possibilidade de o crédito se dar posteriormente ao lançamento na conta-corrente do responsável.
Postos os termos da consulta, passo a esclarecer.
É sabido que a prova do preparo do recurso deve ocorrer no ato de sua interposição, consoante expressamente impõe o art. 511 do Código de Processo Civil. Em não ocorrendo a prova do recolhimento das custas processuais e do valor do porte de remessa e retorno dos autos, quando exigível, no momento do protocolo, o recurso deve ser julgado deserto, o que impede ultrapasse o juízo de prelibação.
As indagações da Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional de Mato Grosso, gravitam em torno da utilização dos meios eletrônicos para a efetivação do pagamento das custas recursais, bem assim das taxas de remessa e retorno dos autos, quando exigível. As transações bancárias por meio eletrônico constituem prática comum nos tempos atuais, dada a facilidade de acesso à internet.
E o Poder Judiciário não pode se postar ao largo dessa realidade, tanto assim é que a gradativa migração para o Processo Judicial Eletrônico se revela meta a ser alcançada em breve neste Tribunal de Justiça.
A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é firme ao admitir a comprovação do preparo por meio de recibo emitido eletronicamente, desde que o seja exatamente no valor da GRU gerada para o processo.
Trago, nesse sentido, os seguintes arestos:
AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. COMPROVAÇÃO DO PREPARO. COMPROVANTE EXTRAÍDO DA INTERNET. MUDANÇA DE ENTENDIMENTO DA CORTE. CABIMENTO. RECURSO ESPECIAL. DISCUSSÃO DE MATÉRIAS QUE NÃO PRESCINDE DA ANÁLISE DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS E DO REVOLVIMENTO DE MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA. AGRAVO REGIMENTAL ACOLHIDO EM PARTE, MANTIDA, CONTUDO, A DECISÃO AGRAVADA POR OUTROS FUNDAMENTOS. (AgRg no AREsp 273.722/SC, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 20/02/2014, DJe 10/03/2014).
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL NÃO CONHECIDO. DESERÇÃO. COMPROVAÇÃO DE PAGAMENTO DE CONTA/TRIBUTO. NÃO ACEITAÇÃO DO COMPROVANTE EXTRAÍDO DA INTERNET. ENTENDIMENTO SUPERADO EM RAZÃO DA AMPLA UTILIZAÇÃO DE MEIO ELETRÔNICO NA VIDA MODERNA. POSSIBILIDADE DE CONFERÊNCIA DOS DADOS LANÇADOS NO DOCUMENTO. NECESSIDADE DE SUPERAÇÃO DO ÓBICE. ÔNUS EXCESSIVO. AGRAVO PROVIDO.
1. Não é razoável impor à parte condições mais rigorosas para a comprovação do pagamento de conta ou tributo (taxas, inclusive) do que aquelas exigidas pelo mercado ou instituições públicas.
2. Para comprovação do preparo, deve ser considerado o uso de meios eletrônicos já incorporados ao cotidiano dos brasileiros, reputando-se válido o comprovante extraído da internet, tendo em vista a possibilidade de aferir se os dados nele lançados referem-se a pagamento relativo a processo específico.
3. Agravo regimental provido. (AgRg no AREsp 249.395/SC, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, Rel. p/ Acórdão Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, TERCEIRA TURMA, julgado em 12/11/2013, DJe 25/02/2014).
Nesse panorama, o recibo emitido eletronicamente pelo banco sacado, como prova de efetivação do preparo do recurso, é documento que deve ser admitido como prova, desde que observados os critérios a seguir estabelecidos.
A guia de recolhimento é extraída diretamente da página eletrônica do Tribunal de Justiça, com o valor equivalente ao custo total do recurso. Assim, o recibo de pagamento eletrônico, a despeito do padrão adotado pelo banco sacado, deve estampar o valor correspondente à guia, bem assim exibir o respectivo código.
No ato do protocolo, a petição do recurso deve estar acompanhada da guia de recolhimento e do recibo eletrônico que lhe corresponde, preenchendo um dos requisitos extrínsecos de admissibilidade do recurso: a prova do preparo no ato da interposição. Outrossim, o recibo emitido eletronicamente deve indicar que o pagamento ocorreu, efetivamente, até a data do protocolo.
Portanto, o mero recibo com indicação de "agendamento" de pagamento da guia não deve ser admitido como prova do preparo, pois descaracteriza o preparo simultâneo à interposição do recurso. Nesse aspecto, cabe ressaltar que a hipótese excepcional prevista pela Súmula 484 do STJ somente se aplicaria se a interposição do recurso ocorresse em meio ao plantão judiciário, considerando que o encerramento das transações eletrônicas ocorre em horário posterior ao do expediente forense.
O preparo se aperfeiçoa com a indicação, no recibo eletrônico, de que houve o lançamento da quantia na conta-corrente do responsável, ou seja, o banco efetuou o débito em favor do Tribunal de Justiça.
Ora, não se pode exigir do jurisdicionado que aguarde a conferência do crédito pelo Controle de Arrecadação antes da admissibilidade do recurso, pois tal preciosismo, por importar em absurdo exagero, depõe contra o princípio do acesso à justiça.
Ademais, possíveis fraudes ou problemas técnicos de repasse do numerário pelo banco, se apontadas pelo Controle de Arrecadação, são questões que dependeriam de investigação e apuração da responsabilidade pelo Tribunal de Justiça.
Os recentes julgados, que trago transcritos, representam o entendimento adotado no Tribunal de Justiça acerca do preparo por meio eletrônico:
APELAÇÃO CÍVEL. COBRANÇA DE SEGURO POR MORTE. PRELIMINAR DE DESERÇÃO. DOCUMENTO DIGITAL. VALIDADE. ARGUIÇÃO DE ILEGITIMIDADE DA HERDEIRA DO SEGURADO. SEGURO CONJUGADO A FINANCIAMENTO. BANCO COMO PRIMEIRO BENEFICIÁRIO. PAGAMENTO DE VALOR RESIDUAL. INTERESSE NA PROCEDÊNCIA DA AÇÃO. PRELIMINAR AFASTADA. SUICÍDIO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA PREMEDITAÇÃO. SEGURO DEVIDO. CORREÇÃO MONETÁRIA A INCIDIR A PARTIR DA COMUNICAÇÃO DO ÓBITO. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. Os documentos eletrônicos são considerados válidos para comprovação do preparo. [...] (Ap, 26450/2010, DES. JOÃO FERREIRA FILHO, PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL, Data do Julgamento 28/11/2012, Data da publicação no DJE 01/02/2013).
"AGRAVO REGIMENTAL. DECISUM QUE JULGOU DESERTO O AGRAVO DE INSTRUMENTO. AGENDAMENTO BANCÁRIO DESTINADO AO PREPARO PARA DATA POSTERIOR À DA INTERPOSIÇÃO DO RECURSO. DESERÇÃO. ART. 511, CAPUT, DO CPC. DECISÃO MANTIDA. RECURSO NÃO PROVIDO.
A comprovação do preparo deve ser feita no momento da interposição do Recurso, sob pena de ser aplicada a deserção, nos termos do artigo 511, caput, do Código de Processo Civil, sendo inadmissível o agendamento para quitação em data futura, ainda que efetivamente realizado. (TJ/MT, AgR, 89191/2012, DES. RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, TRIBUNAL PLENO, Data do Julgamento 13/12/2012, Data da publicação no DJE 24/01/2013). AGRAVO DE INSTRUMENTO . AUSÊNCIA DO COMPROVANTE DE PAGAMENTO DAS CUSTAS . JUNTADA DO COMPROVANTE DE AGENDAMENTO . INADIMISSIBLIDADE - NÃO CONHECIMENTO.
A demonstração do pagamento do preparo deve ocorrer no momento da interposição do Recurso, sob pena de ser aplicada a deserção, sendo
inadmissível o agendamento para quitação em data futura, ainda que efetivamente realizado. (AI, 52302/2013, DES.MARCOS MACHADO, PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL, Data do Julgamento 29/05/2013, Data da publicação no DJE 04/06/2013)
Com base nessas premissas, passo a responder, pontualmente, à consulta:
a) O uso do recibo emitido eletronicamente por instituição financeira, como prova do preparo do recurso interposto, é válido e admissível para o fim a que se destina;
b) O recibo eletrônico deve estar acompanhado da guia de recolhimento
da taxa e do porte de remessa e retorno, quando exigido, para que tenha validade, a fim de que seja aferido o valor total do preparo;
c) Somente será admitido o recibo em que a data do lançamento efetuado na conta-corrente do responsável for anterior ou concomitante à data do protocolo do recurso;
d) Não deve ser admitido recibo de "agendamento" de pagamento, salvo a hipótese de recurso interposto durante o plantão judiciário;
São esses os esclarecimentos pertinentes à consulta.
Registre-se e autue-se o presente expediente.
Dê-se ciência ao consulente.
Publique-se para conhecimento geral.
Cumpra-se.
Cuiabá-MT, 17 de setembro de 2014.
Desembargador ORLANDO DE ALMEIDA PERRI,
Presidente do Tribunal de Justiça de MT.
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