A criação da figura do juiz de garantias, aprovada por deputados e senadores no chamado Pacote Anticrime e sancionada pela presidência, tem a missão de reafirmar uma série de garantias previstas em nossa Constituição, medidas determinadas para que ocorra no sistema judicial o chamado devido processo legal e, ainda de forma implícita, a imparcialidade objetiva dos magistrados, responsáveis pela condução das ações judiciais.
Antes de tratar a importância deste instituto, é preciso explicar ao cidadão comum como funcionará o juiz de garantias. Na prática, significa que o magistrado que atuar na fase de investigação de um crime não será aquele responsável por julgar o processo. Ou seja, enquanto um juiz defere ou indefere prisões cautelares, sequestros de bens, interceptações telefônicas e outros tantos dispositivos existentes no Código de Processo Penal, o outro analisará o mérito do processo e condenará ou absolverá os alvos da ação.
Esta separação de atribuições visa justamente assegurar a efetividade da garantia constitucional da imparcialidade do juiz, prevista de forma explícita em uma série de tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário e de forma implícita na nossa carta magna, que entre suas garantias fundamentais estabelece, entre outras coisas, juiz natural, devido processo legal, contraditório e ampla defesa, além de motivação e publicidade. Não há como se assegurar estas garantias sem que se tenha um juiz objetivamente imparcial.
Com a criação da figura do juiz de garantias, os legisladores reforçaram o modelo de processo penal projetado pelos constituintes há 31 anos. Com toda a certeza, não estava entre as intenções daqueles que escreveram nossa tão elogiada carta magna que houvesse algo diferente da imparcialidade objetiva, que fica prejudicada quando, antes de analisar o mérito de uma ação, o magistrado realiza pré-juízos ou pré-conceitos sobre o fato objeto do julgamento, durante a fase de investigação.
O modelo que será implantado no Brasil faz parte do sistema judicial de diversos países considerados vanguardistas no que se refere ao devido processo legal. Estamos falando do Código Penal Português, que desde de 1987 criou a figura do juiz de instrução, do Código de Processo Penal italiano de 1988 e do Chile, que também faz esta separação.
Falando do Brasil, é sempre bom destacar que a criação do juiz de garantias não representa a criação de um novo órgão dentro do Poder Judiciário. Trata-se, apenas, da separação de atribuições entre dois juízes. Este modelo não é completamente estranho ao nosso sistema. Iniciativas semelhantes já foram adotadas em São Paulo, no Paraná e até mesmo na 13ª Vara Federal de Curitiba, responsável pelos processos decorrentes da Operação Lava Jato.
Ter em nosso sistema judicial um juiz de garantias reforça a imparcialidade da Justiça, assegura a aplicação das garantias fundamentais de todos os brasileiros e dá a certeza de que, após a prolatação da sentença, tenha ocorrido um processo justo, que respeite nossa Constituição.
*Leonardo Campos é presidente da OAB-MT