Os condôminos inadimplentes sempre são uma dor de cabeça para o síndico e também para o condomínio. E não tem como escapar, todo condomínio, sem exceção, possui condôminos que são inadimplentes.
Sabemos que, tal como afirma o Código Civil, mais precisamente em seu art. 1.348, VII, compete ao síndico cobrar dos condôminos as suas contribuições, bem como impor e cobrar multas devidas.
Todavia, mesmo com a cobrança de multas, avisos e tudo mais, alguns inadimplentes ainda insistem em não pagar sua cota condominial.
É nesse momento que, muitas vezes, o síndico, ou a assembleia de condôminos, resolve tomar algumas atitudes drásticas para coagir o inadimplente à pagar o que deve.
Certas vezes resolvem cortar o fornecimento de água e gás do condômino, ou então, mais drasticamente, o impedem de frequentar áreas de uso comum do condomínio, tais como piscina, churrasqueira, quadra de esportes e áreas de lazer em geral.
Mas isso é legal?
Em recente decisão publicada no DJE de 22.01.2019, o Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, entendeu ser indevido restringir o acesso dos condôminos inadimplentes ao espaço gourmet do condomínio, pois não existe no Código Civil qualquer amparo legal para tanto:
“APELAÇÃO CÍVEL – Ação Constitutiva de Manutenção do Exercício de Direitos de Propriedade e Uso por Condômino cumulada com Pedido de Indenização por Danos Morais e Declaração de Nulidade de Decisões tomadas em Assembleia de Condomínio – DESCONTO POR PONTUALIDADE – LEGALIDADE – CONDÔMINO INADIMPLENTE – RESTRIÇÃO DE ACESSO ÀS ÁREAS COMUNS DO CONDOMÍNIO – ILEGALIDADE – DANOS MORAIS – INOCORRÊNCIA - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.I - Embora a utilização do chamado “desconto por pontualidade” (mecanismo utilizado pelos condomínios para incentivar o condômino a fazer o pagamento da taxa condominial antes do prazo de vencimento estipulado no boleto, o que, no caso gera um desconto), seja perfeitamente possível e legal, conforme pacífica jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, lado outro, a meu ver, não tem qualquer amparo legal a restrição dos condôminos inadimplentes ao acesso às áreas comuns do condomínio, entre elas, como no caso, o espaço “gourmet”. II - Em que pese tenha sido aprovado em assembleia condominial, tenho que, por não estar amparada no Código Civil, não há como restringir o condômino inadimplente ao acesso do espaço “gourmet”, área comum do condomínio. III - No que tange ao pedido de danos morais, não assiste razão aos autores, ora apelantes, isso porque, não há nenhuma prova nos Autos de que, no momento em que não tiveram a entrega das chaves do espaço “gourmet”, tenham sido submetidos e expostos pelo síndico, à época, a qualquer tipo de constrangimento e ainda mais perante aos demais condôminos.” (EMBARGOS DE DECLARAÇÃO CÍVEL SERLY MARCONDES ALVES, QUARTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO, Julgado em 19/12/2018, Publicado no DJE 22/01/2019).
Esse entendimento acerca da proibição em aplicar qualquer sanção restritiva de direitos ao condomínio inadimplente é indevida, haja vista que fere o direito de propriedade insculpido na Constituição Federal em seu art. 5º, XXII.
Para a inadimplência vigora o princípio da pecuniariedade das penalidades. Isso significa que a punição ao inadimplente deve ter natureza estritamente patrimonial, sendo a única exceção a esta regra trazida pelo próprio Código Civil em seu art. 1.335, III, que veda o voto e a participação dos condôminos inadimplentes nas assembleias de condomínio.
Seguindo essa mesma linha de pensamento, entendo ser completamente ilegal a proibição do inadimplente em utilizar as áreas comuns do condomínio.
O ato de vedar a circulação ou a utilização desses espaços configura uma dupla punição ao inadimplente, haja vista que ao pagar o valor da cota condominial em atraso, nela será cobrada a multa legal, correção monetária, juros e honorários advocatícios.
Caso o síndico adote essa atitude de proibição, o condômino inadimplente poderá propor ação de obrigação de fazer, muitas vezes cumulada com danos morais, o que irá gerar uma despesa extra e muita dor de cabeça à administração do condomínio que já sofre com a situação de inadimplência.
O condomínio possui maneiras legais e menos gravosas ao devedor para cobrar seu débito. Os encargos moratórios já estão previstos no Código Civil. Várias são as ações judiciais cabíveis para obrigar o condômino a adimplir com sua obrigação. Até mesmo a penhora do imóvel é possível, haja vista o caráter propter rem do débito.
Portanto, deve-se sempre evitar qualquer decisão extrema como a da proibição que falamos aqui neste artigo, pois ele fere de plano o direito de propriedade.
*Miguel Zaim é doutor em Ciências Jurídicas e Sociais, especialista em Direito Imobiliário, Direito e Processo Penal, Direito e Processo Civil, Direito Constitucional, Direito Tributário, e Direito Ambiental, presidente da Comissão de Direito Condominial da OAB-MT