Passamos por uma Era de muitas mudanças nos campos tecnológico, social, cultural, político e econômico, inclusive, no que se refere os avanços da inteligência artificial e da genética humana, o que tem gerado profundos impactos no comportamento da sociedade e nas profissões, sobretudo na advocacia. Novas necessidades de mercado surgem diariamente, e demandas cada vez mais complexas e inusitadas baterão às portas dos escritórios de advocacia num futuro bem próximo, substituindo muitas necessidades atuais que deixarão de existir devido às mudanças que o mundo vive.
O mundo não para! Todo dia uma inovação é colocada no mercado, uma nova lei entra em vigor, e novas demandas são exigidas. Hoje, mais do que em qualquer outra época, requer do advogado, dos escritórios de advocacia e dos departamentos jurídicos, a necessidade de se reinventarem, de pensarem além do que se aprendeu nas Faculdades de Direito, e de desenvolverem habilidades multidisciplinares para encarar as mudanças constantes da sociedade e tudo que a envolve. Com a concorrência cada vez mais acirrada, sobreviverá do Direito quem estiver preparado para exercer a profissão com o intuito de atender, da melhor forma possível, as necessidades do mundo moderno e de seus clientes, que estão cada vez mais exigentes e necessitados de ajuda especializada.
O advogado do século XXI, deve dispor de habilidades que não aprenderam na faculdade, tendo em vista a automação, a inteligência artificial e as novas necessidades de seus clientes. O mundo contemporâneo impõe uma reformulação na carreira jurídica, no sentido de pensar além do processo em si, do direito posto, do litígio, da contenda. É necessário compreender que se faz imprescindível uma mudança de postura, de mentalidade, porque o advogado é a primeira porta de acesso do cliente, e ao tomar conhecimento do problema, precisará pensar sobre qual estratégia irá conduzi-lo: se será por meio da mediação; da arbitragem, ou até mesmo via o judiciário – isso dependerá das condições específicas de cada caso.
Não é mais aceitável a manutenção da velha postura do “vamos entrar com uma ação”! A expressão “acesso à justiça” por muito tempo foi entendida como acesso ao judiciário, já que a Constituição federal de 1988, prevê o princípio da inafastabilidade do acesso à justiça, e a garantia da via judiciária. Entretanto é notório que o Poder Judiciário está superlotado, atualmente, existem mais de 110 milhões de processos para 207 milhões de habitantes! Somando a isso, a demora na prestação jurisdicional, o excesso de formalismos, procedimentos complicados, e a possibilidade de recursos infindáveis, inviabiliza a efetivação da justiça, fazendo com que a sociedade testemunhe na pele a máxima de Rui Barbosa ao constatar que a justiça tardia não foi sequer justa.
O mundo não comporta advogados fazendo o “mais do mesmo”. Sempre houve a alegação de que o judiciário estava sobrecarregado, e por isso, é necessário e urgente, a contratação de mais funcionários e juízes. Todavia ainda que triplicássemos a quantidade de funcionários e juízes, essa conta nunca fecharia, isso porque os operadores do Direito têm conhecimento que sempre haverá milhares de processos tramitando, como um círculo vicioso. Um dado importante do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) corrobora com essa realidade: de cada 10 processos apenas 03 são julgados em um prazo médio de 08 anos! Nesse sentido, um imperador chinês do século XII, já havia dito que chegaria um dia em que seria preciso metade da população para julgar a outra metade. Esse dia, infelizmente, chegou!
Ao Poder Judiciário se impõe o compromisso de garantir, com independência, o cumprimento da Constituição e das leis do País, isto é, deve ser reservado à essa instituição, a resolução de causas mais significativas, complexas e que exijam o controle da legalidade nos casos de lesão ou ameaça de lesão a direitos. Todas as demais questões relativas a divergências de interesses, ruídos de comunicação, relações convencionais conflituosas, e todas as questões que possam ser negociadas, podem e devem encontrar melhor resolução por meio dos Métodos Adequados de Solução de Conflitos (MASC´s), ao invés daqueles adversariais originados no modelo público tradicional desenvolvido perante o Poder Judiciário. Dessa forma, o sistema judiciário - como um todo - poderá cumprir o seu papel com eficiência, e em tempo razoável.
Hoje, existem múltiplas possibilidades ou multiportas de acesso à justiça. Os meios disponíveis são vários, cabendo ao advogado adotar o mais adequado para cada situação. O advogado precisa se adequar ao mundo contemporâneo, urgentemente, no sentido de indicar aos seus clientes os métodos extrajudiciais de solução de conflitos, tais como, a mediação e a arbitragem, procedimentos estes utilizados há décadas pelos países de primeiro mundo.
Bons advogados são bons negociadores, todavia, o mediador é um terceiro, neutro e imparcial, que leva a vantagem de não estar envolvido emocionalmente na disputa, posto que não defende nenhuma das partes, além de conhecer a teoria dos jogos, técnicas apropriadas, e saber da importância e das possibilidades do ‘ganha-ganha’. O advogado do século XXI, deve caminhar para uma advocacia colaborativa nos procedimentos consensuais, criando as melhores condições para a composição do litígio, e também, precisa manter uma postura eficiente nas arbitragens, ciente de que pode apresentar seus argumentos utilizando de recursos audiovisuais, exposições orais, a utilização do PowerPoint, e de todas as ferramentas disponíveis para convencer o árbitro de sua tese.
Atualmente, é imposto ao advogado uma postura de apresentar ao seu cliente o método mais eficaz à solução de seu conflito, ou seja, um modo rápido, econômico, eficiente e justo, portanto, precisa aprender a agir de modo preventivo, inclusive, recomendando aos seus clientes o aporte de cláusulas compromissórias simples ou escalonadas nos contratos. Ao advogado compete soluções mais criativas, uma mentalidade empreendedora, com pensamento mais proativo e menos reativo que possibilita uma comunicação efetiva e que vai muito além de saber se expressar bem. O advogado do século XXI precisa saber ouvir (a escuta ativa) para se conectar com o seu cliente, utilizando-se da empatia - uma habilidade de se colocar no lugar do outro e pensar como ele. Soma-se a isso, a habilidade da negociação - incorporar a cultura do consenso. A sociedade contemporânea é impaciente com advogados que se esquecem das necessidades reais dos clientes, dando-lhes as costas em benefício de teses que, embora bem fundamentadas, podem não estar trazendo resultados correspondentes a essas necessidades.
Na ponta do lápis, considerando custos e benefícios, a acumulação de centenas de processos nas pastas dos escritórios acarreta imensas perdas e aborrecimentos, em oposição aos ganhos e à satisfação dos clientes com as soluções consensuais que a mediação pode ensejar, hipótese em que os honorários são de pronto percebidos. Este é um dos motivos porque começam a surgir, também em nosso país, escritórios de advocacia colaborativa, exclusivamente voltados para essas práticas, e que não atuam em litígios judiciais. Com efeito, a contribuição do advogado para o êxito da mediação é inestimável. Contudo mostra-se indispensável uma adaptação comportamental e estratégica em sua postura, com vistas a potencializar as chances de sucesso da mediação e amainar, ao invés de incrementar, o grau de litigiosidade entre as partes.
* Melanie de Carvalho Tonsic é empresária, advogada, mediadora e arbitralista. Fundadora e Presidente da ACORDIA - Câmara de Conciliação, Mediação e Arbitragem.