Já há alguns anos os brasileiros encamparam a ideia de origem americana e entraram no clima do Black Friday, que pode ser resumida como uma prática comercial adotada no final do mês de novembro, com o objetivo de aumentar as vendas a partir de oferta de produtos por preços reduzidos. Essa é a ideia central que se vende na mídia. Mas, será isso mesmo?
Por força dos princípios contidos no Código de Defesa do Consumidor, é necessário que se faça uma análise acerca desta prática comercial, pois o consumidor eventualmente pode ser induzido a erro na hora da compra do produto escolhido, especialmente pela ânsia da espera por este momento mais favorável.
Alguns cuidados são necessários para evitar abusos e decepções, pois a ansiedade não costuma ser boa conselheira. Ademais, não é mera coincidência que o Black Friday aconteça em novembro, mês em que significativa parcela de trabalhadores recebe o 13º salário, ou seja, um mês antes do Natal, época em que há mais disputa pelo rico dinheirinho do trabalhador.
Na verdade, pode-se imaginar que os esperados descontos que ocorrem durante o dia (ou a semana) do Black Friday tenham o principal propósito de alavancar as vendas (algumas vezes “emperradas” por conta da economia atualmente em frangalhos), de forma a permitir uma recuperação do fôlego pelos comerciantes, que precisam fazer caixa para pagar férias, décimo terceiro salário e outros encargos, renovando seus estoques para o grande movimento de vendas que costuma ocorrer por ocasião das festividades do Natal e Ano Novo.
Nos primeiros anos de Black Friday à brasileira muitos comerciantes inescrupulosos, imbuídos de má-fé e com finalidade única de ter maior lucratividade, maquiaram os preços dos produtos na véspera da “grande promoção”, para depois aplicarem os esperados “descontos”, chegando, na prática, ao mesmo preço de antes, conduta essa que configura propaganda enganosa e prática ilegal, que recebeu de alguns o apelido de “black fraude”, e que, obviamente, é vedada pelo Código Consumerista.
Atentos a tal prática abusiva, vários PROCONs fizeram alertas aos consumidores, no sentido de não caírem nas pegadinhas de produtos falsamente mais baratos ou que não atendiam às finalidades para as quais foram propagados por falsas promoções, nem comprar produtos de qualidade inferior ao que espera ou necessita, a partir do conteúdo veiculado pelas mídias ou por folders de propaganda.
Nos termos do CDC – Código de Defesa do Consumidor, é enganosa qualquer modalidade de informação ou comunicação de caráter publicitário, total ou parcialmente falsa, ou, por qualquer outro modo, mesmo por omissão, capaz de induzirem a erro o consumidor a respeito da natureza, das características, da qualidade, da quantidade, das propriedades, origem, preço e quaisquer outros dados sobre produtos e serviços. Isso está expressamente definido no art. 37, §1°, do CDC, ou seja, propaganda enganosa é prática ilícita.
De toda sorte, se após a compra o consumidor perceber que o produto adquirido, por alguma razão, não condiz com o que foi veiculado pelo consumidor, e ele se sentir insatisfeito, a legislação consumerista lhe apresenta algumas alternativas, podendo, por exemplo, devolver o produto dentro do prazo de 7 (sete) dias corridos, não sendo necessário apresentar qualquer motivo ou razão para a devolução, devendo, neste caso, ser imediatamente reembolsado.
Por outro lado, o fornecedor do produto deverá cumprir o que foi anunciado, a exemplo do prazo de entrega, características do produto, preço, condições de pagamento, etc. Caso o fornecedor não o faça, o consumidor poderá, a seu critério, desfazer o negócio, aceitar outro produto (ou serviço), ou exigir judicialmente o cumprimento do que foi inicialmente anunciado. Isto é escolha do consumidor!
Agora, se o produto adquirido apresentar algum defeito de qualidade ou de quantidade que o torne impróprio para o uso a que se destina, o consumidor poderá, dentro do prazo de 90 (noventa) dias contados da data de entrega, fazer a reclamação cabível, se for bem durável, ou em 30 (trinta) dias, para outros tipos de produtos.
Como muitas compras atualmente são feitas de forma virtual, pela internet, um outro aspecto muito importante a que o consumidor deve ficar atento na hora da compra é verificar se a conexão da internet é segura. Para isso, ele deve checar se o site do fornecedor possui conexão segura, e para isso basta verificar se a página acessada utiliza o SSL (Secure Socket Layer), que é uma ferramenta virtual utilizada na internet para garantir que as informações trocadas são seguras, o que se comprova, na prática, com o surgimento de um cadeado de cor verde que deve aparecer ao lado da URL do site acessado, ou seja, de seu endereço na rede.
Esses são alguns dos cuidados que devem ser observados nesta época de grandes tentações, como é o caso do fenômeno Black Friday.
Em ocorrendo alguma lesão, deve o consumidor procurar os órgãos de proteção e fiscalização, como o PROCON, Juizados Especiais, Delegacias Especializadas do Consumidor etc, para que seus direitos sejam respeitados e o sonho de consumo não se transforme em pesadelo de insatisfação.
*Gisele Nascimento, advogada em Mato Grosso, especialista em Direito Civil e Processo Civil, pós-graduanda em Direito do Consumidor e membro da Comissão de Defesa da Mulher OAB-MT.