O método é útil para auxiliar o Judiciário, bem como os todos os órgãos públicos por ser informal, mais célere, mais econômico, e eficaz para sanar os conflitos por meio do diálogo com empoderamento das partes de onde se emergirá a solução consensual entre eles. No entanto, esse não deve ser visto apenas com esse fim, pois, equivaleria retirar responsabilidade do Estado na gestão e administração da justiça.
É uma técnica extrajudicial de resolução de conflitos, por meio da qual as próprias partes, com o auxílio imparcial de um terceiro, buscam dialogar para resolver os seus conflitos de forma satisfatória.
Tratando-se de um meio de resolução de conflitos, não litigioso e baseado no consenso é propício ao desenvolvimento de soluções criativas, preservando a relação entre as partes em conflito. Aqui, trabalha-se a cooperação (para resolver um problema comum), o respeito, a identidade e o reconhecimento do outro enquanto pessoa e ser total.
Nesses termos, aduz a doutrinadora Hilda Ana Prawda (2011):
“Na atualidade a mediação está organizada em um corpo de conhecimentos teóricos-práticos que permitem definir como procedimento alternativo para a resolução de conflitos.”
A escola é uma instituição integrada por pessoas de distintas idades, que realizam diversas tarefas e, por sua natureza e funções estas pessoas convivem no mesmo ambiente durante várias horas ao dia” sendo, talvez, esse fato o motivo da ocorrência de tantos conflitos.
Histórico
As ações práticas da mediação antecederam ao surgimento das históricas definições e realizações do Direito e da Justiça modernos. O Direito Romano é uma referência de luz no caminhar do homem, assim como o Código de Hamurabi , surpreende e assusta por ser um dos primeiros registros da presença da Lei. É certo que, antes disso tudo, os seres humanos já praticavam formas “legais” de dirimir seus conflitos e pendências em quaisquer campos, inclusive na arena comercial.
Essa antiga forma de mediar está de volta com muita força. Ressurge com uma nova roupagem e, com previsão legal onde o próprio Poder Judiciário é o responsável pela formação dos mediadores.
Com o passar do tempo, com a prática demonstrou sua eficiência e neste diapasão da evolução nasce o instituto da mediação propriamente dita, sendo reconhecido definitivamente com o seu potencial na década de 1970, nos Estados Unidos, depois se espalhando para o Canadá, China e vários países da Europa, que buscou resolver seus próprios conflitos e adaptaram pela prática eminente da mediação. No entanto, os Estados Unidos foi o primeiro país a incorporar ao sistema estatal a mediação, chegando a ser obrigatório antes de qualquer procedimento judicial, buscando a celeridade e, como meio de fugir das altas custas decorrentes do processo.
Mas foi na década de 80 que os resultados do Programa de Mediação Comunitária, com as atividades do programa levadas para as escolas, com a finalidade de ensinar aos alunos a mediarem seus conflitos que demonstrou-se resultados satisfatórios. No ano de 1984 surge, nos Estados Unidos, a NAME, Associação Nacional de Mediação Escolar, que serviria para o estudo e implementação da mediação e, em 1985, a NAME funde-se com o NIDRF, Instituto Nacional de Resolução de Litígios, nascendo a CRENET, Rede de Resolução de Conflitos na Educação. Neste último ano, os educadores para a responsabilidade social e o Conselho de Educação da cidade de Nova Iorque, promovem a colaboração entre grupos comunitários e escolares, propiciando o surgimento do “Programa de resolução criativa de conflitos”. No primeiro momento foi realizado um programa para os estudantes e, depois foram elaborados currículos de Resolução de Conflitos para as instituições de ensino. Progressivamente, os programas de resolução de conflitos no âmbito escolar foram se estendendo por todo mundo e, atualmente existem na Argentina, Nova Zelândia, Canadá; França, Grã-Bretanha, Suíça, Bélgica, Polônia, Alemanha, Espanha, entre outros.
Justificativa
A mediação no ambiente escolar no Brasil está na fase inicial com algumas experiências e, felizmente este método de solução de conflitos está se tornando mais usual. O instituto surge como forma de resolver conflitos, correspondendo ao método de autocomposição, mas não nasce para aliviar tribunais, mas sim para levar a cultura da paz social às comunidades, uma vez que a cada dia os conflitos aumentam e tendem a ser mais violentos.
O que se observa no Estado de Mato Grosso é que os conflitos vêm aumentando nos últimos anos, sendo que até mortes já aconteceram dentro das escolas. Como consequência a SEDUC/Unidade Setorial de Correição, vem instaurando grande número de processos administrativos.
Este aumento de processos vem gerando ônus financeiro ao Estado, que se vê obrigado por força de dispositivo legal a instaurar o procedimento administrativo sob pena de incorrer em ilícito, para assim manter a paz social no âmbito das unidades escolares.
Mas o que é conflito? Segundo o Dicionário Aurélio, conflito significa: ‘choque’, ‘embate’, ‘peleja’. Desta forma, abordar as disputas escolares através da mediação origina um contexto onde o conflito é encarado como natural o que permite protagonismo aos intervenientes, enquanto que os valores da solidariedade, tolerância e igualdade são estimulados.
Como prática social, a educação tem como locus privilegiado a escola, entendida como espaço de garantia de direitos. Para tanto, é fundamental atentar para as demandas da sociedade como parâmetro para o desenvolvimento das atividades.
Como direito social, avulta, de um lado, a defesa da educação pública, gratuita, democrática, inclusiva e de qualidade social para todos e, de outro, a universalização do acesso, a ampliação da jornada escolar e a garantia da permanência bem-sucedida para crianças, jovens e adultos, em todas as etapas e modalidades de educação básica.
A escola é uma instituição confiável capaz de preservar os direitos prometidos pelo sistema, por ter um ambiente possível de implantação de novas técnicas e métodos consensuais de resolução de controvérsias, haja vista acolher pessoas de diversos tipos e formações, e os conflitos que ai se origina se repercutem neste mesmo ambiente, pois são provenientes do meio social em que vivem, como nos ensina Ana Prawda:
La escuela es una institución integrada por personas de distintas edades y fomación que realizan diversas tareas. Por la naturaleza de su funciones, estas personas conviven em el mismo âmbito durante varias horas al dia.
La escuela no existe separda del meio em que actúa. Ès uma comunidad activa que forma parte de la sociedad y sus mienbros tienen los mismos problemas presonales y sociales que el resto de la población.
Por eso no debe extranar que em la escuela se originen conflitos, ni repercutan o se desarrolen otros en ella, provenientes del médio social”
Para resolver e transformar o conflito no contexto educativo pelo método da mediação exige-se mudança de comportamento desenvolvimento de habilidades e capacidades para a gestão de resolução dos conflitos, com envolvimento de toda comunidade escolar. Nada adiantará se as crianças e os jovens estudantes sejam sensibilizadas e treinadas para uma cultura de diálogo, de escuta e de pacificação das relações interpessoais, se o discurso de educadores e docentes for incoerente com esta postura.
Faz-se urgente e necessário, reconhecer que os mecanismos institucionais tradicionalmente disponíveis para a resolução de conflitos na escola não têm dado conta desses desafios, haja vista os elevados números de processos que são instaurados no âmbito administrativo.
É consabido que os conflitos existentes na escola muitas vezes atrapalham o ensino-aprendizagem dos alunos e interfere na convivência social do ambiente escolar, razão pela qual pode ser tão útil nesta seara. O instituto jurídico da mediação é sempre lembrado quando se fala no congestionamento processual do nosso Poder Judiciário brasileiro, frequentemente criticado na sua atuação em decorrência da complexidade e morosidade.
Considerando que as competências para trabalhar o conflito são essenciais numa sociedade democrática, o Brasil vem adotando mecanismos de resolução de conflitos na escola, com algumas experiências exitosas em muitos Estados, mas em Mato Grosso este trabalho é inédito.
Assim sendo, escolheu-se a mediação escolar porque o ambiente escolar é um lugar onde se encontram diversos tipos de pessoas e cada uma delas com sua etnia, cultura, religião, educação, personalidade e opinião, através dessa mistura, é comum que existam conflitos de inúmeras formas, pois cada um tem sua maneira de ser, e nem sempre respeita ou concorda com a do outro.
Alguns autores entendem que o rol de mediadores pode ser assumido por diferentes atores da comunidade educativa: os alunos, os diretores, os docentes, os profissionais da educação ou até mesmo uma pessoa da comunidade escolar, outros não concordam com essa possibilidade, de onde se deduz que não há uma opinião unificada que decida quem e como se deve mediar na escola.
No entanto, a Lei 13.140/2015 deixou claro que os mediadores devem ser graduados, mas também devem possuir formação como mediador, em cursos que proporcionem vivências dos aspectos fundamentais na prática da mediação.
Desta forma, consideramos ser indispensável a reformulação do currículo escolar dos estudantes de direito inserindo novas formas de composição de litígio, com ênfase nas leis e teorias sobre mediação, trazendo novos elementos exemplificativos de aplicabilidade nos conflitos, para assim criar a Cultura da Paz Social.
A Mediação e Conciliação na Secretaria de Estado de Educação
A Secretaria de Estado de Educação do Estado de Mato Grosso, Esporte e Lazer, com aproximadamente 40 mil servidores em 750 unidades escolares, enfrenta problemas de ordem processual administrativa, tendo em vista que a escola como espaços congregam alunos, professores, técnicos, funcionários, pais e responsáveis, formando uma coletividade com identidade específica e diversificada, com elevados níveis de violência e conflitos entre os servidores, que se relacionam entre si e com toda a comunidade escolar.
Pelas razões acima mencionadas, ocorrem, no âmbito escolar, uma série de conflitos que exigem soluções administrativo-disciplinares e éticas, por via das vezes constrangedoras e até mesmo ensejadoras de processos judiciais, uma vez que os servidores, como é costumeiro nas relações humanas, muitas vezes não se veem como colegas, e sim, como adversários, o que resulta em atitudes e denúncias infundadas, equivocadas, quando não, agressivas, no ambiente de trabalho.
É fato que esses problemas são encaminhados ao órgão central, seja por meio de denúncias anônimas, seja por meio de protocolos oriundos das equipes gestoras, alunos, pais e, mesmo de profissionais da educação, criando um volume incontável de processos, cuja demanda poderia ser resolvida nas próprias unidades escolares, caso houvesse nestas ou nas Assessorias Pedagógicas, na Unidade Corregedora e também na Comissão de Ética profissionais formados em Mediação e Conciliação de Conflitos.
Numa tentativa de minimizar os problemas de conflitos e redução do numero de processos que chegam no órgão central/SEDUC, teve inicio os trabalhos na área com o “Projeto CONCILIAR”, oriundo da Controladoria Geral do Estado que foi regulamentado pelo Decreto Estadual nº 2.328/2014, no qual existe a possibilidade de se firmar um Termo de Ajustamento de Conduta com os servidores ajustantes em consonância com as legislações internas da Secretaria de Estado de Educação, Esporte e Lazer do Estado de Mato Grosso.
Nesse sentido, a SEDUC firmou com o Tribunal de Justiça um Termo de Cooperação para capacitar e formar os servidores públicos, docentes e comunidade como Mediadores de Conflitos, aperfeiçoando-os no uso das Técnicas da Mediação e Conciliação, com vista estabelecer a cultura da Paz no Ambiente Escolar.
De maneira que, a adoção dessas novas práticas para uso eficiente dos recursos materiais e humanos desta Secretaria de Estado do Mato Grosso, envolve, eminentemente, a implementação de nova cultura, de maneira que todos se conscientizem de seus papéis, e de que, por meio dessas novas práticas, consigam construir suas próprias soluções consensualmente. Assim agindo, ganham os profissionais, os alunos, a comunidade escolar e a sociedade por meio da construção de uma cultura de paz social por meio da lide sociológica humanista.
Vale destacar que o último o Relatório Anual da SEDUC que compreende universo composto por 730 unidades escolares, tem-se procedimentos administrativos disciplinares de investigação, instrução sumária, sindicância administrativa e processo administrativo disciplinar que demandam um número cada vez maior de servidores, com tempo estimado de 02(dois) anos e, custam em média para erário da fazenda pública o valor de aproximadamente R$ 153.000,00 ( cento e cinquenta e três mil reais) de acordo com o último levantamento feito pela CGU/2012/CGE/MT, além do desgaste pessoal e profissional aos envolvidos.
Ressalta-se que, em momento algum, defende-se um posicionamento administrativo/jurídico que venha substituir o cerne pedagógico dos procedimentos que rotineiramente devem presidir as unidades escolares em suas decisões, quando transgredidos as normas de convivência. Ao contrário, será mediando as relações conflitantes com intervenções pedagógicas que as estratégias saneadoras poderão ser legitimadas, confirmando o verdadeiro contexto educativo que deve caracterizar a instituição escolar.
REFERÊNCIAS
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*Valquíria de Carvalho Azevedo é graduada em Biologia e Direito, pós-graduada em Biologia de Ambientes Inundáveis no Pantanal Mato-grossense; Direito Ambiental e Direito Público; doutoranda em Direito pela Universidad Nacional de Lomas de Zamora/Argentina. Também é presidente do Instituto Mato-grossense de Direito e Educação Ambiental. Ainda é advogada e servidora pública exercendo a função de corregedora na Unidade Setorial de Correição Disciplinar da Secretaria de Estado de Educação e membro da Comissão de Meio Ambiente e da Comissão de Conciliação e Mediação da OAB-MT