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Uma carta ao amigo Gustavo

Data: 17/03/2016 13:30

Autor: Flávio Ferreira

img    Recebi um whatsapp do amigo e advogado Gustavo, que foi meu aluno, o qual vi crescer e se casar dentro da minha casa. Ele me pede pra levar à OAB-MT - da qual estou vice-presidente -  a discussão sobre a ilegalidade da quebra do sigilo bancário da presidente Dilma, ocorrida ontem. E aqui vai meu  inseguro sentimento sobre o que está acontecendo:

    Amigo Gustavo, tenho acompanhado a crise política e institucional que vivemos, e que se arrasta há  anos. Penso, ainda, que a crise é bem mais ampla do que a mídia traz. Vejo que se trata de uma guerra pelo poder, bancada pelo grande capitalismo. Fico aqui imaginando qual o erro que o governo atual cometeu? Será que não aceitou negociar com os grandes veículos de comunicação? Ou será que “peitou” alguma proposta financeira, que recebeu daqueles que têm bancado as campanhas políticas há décadas? Ou em que momento a vaidade dos que assinam os cheques no governo disseram não aos seguidos e históricos desvios de verbas públicas?

    Você sabe, amigo, que nós que estamos na “base da pirâmide”.Nós, que sustentamos os que sempre estiveram no poder, somos apenas massa de manobra das grandes corporações capitalistas.  Nós, que corremos o tempo todo pra pagar nossas contas, sempre violentados por juros absurdos, temos mais essa conta pra pagar! Os discursos políticos, amigo, são textos decorados pra nos inflamar a ter um lado nessa briga desleal e covarde.  Nossos representantes no Congresso Nacional se valem do adágio popular dos campos de pelada das várzeas da nossa infância: “...do pescoço pra baixo é canela!"

    Aqui, vale lembrar a triste frase atribuída ao folclórico político baiano Antônio Carlos Magalhães:  “...na política até boi voa!Assim, meu amigo Gustavo, parece que o boi está plainando há tempos em Brasília. Fico ainda imaginando o que nossas filhas e filhos irão estudar no futuro, além das mobilizações, quando forem divulgados os encontros secretos a favor e contra. As articulações de como operacionalizar a queda do governo. Quem assumirá? Temer? Eduardo Cunha? Aécio Neves? A volta do criminoso regime militar?... Imagine, amigo Gustavo, que opções temos neste momento? Ou talvez devêssemos refletir: que falta de opção, meu Deus!

    E agora, José? Como diria o Drummond...  e agora, amigo Gustavo?! E agora?  O que ainda viveremos? E o que me vem ao coração é a citação do Mestre Jesus que nos ensina “...o escândalo é necessário, mas ai daquele(a) por quem o escândalo vier...” E, meu amigo, penso que a sentença da Dilma foi decretada já faz algum tempo, quando seu governo não aceitou alguma imposição do grande capital, porque nossa história política sempre foi escrita desta forma lamentável.

    Sobre seu pedido, meu amigo, pra defender o ato ilegal do Juiz Moro da escuta telefônica na reunião da OAB que teremos amanhã (17/03) votarei com minha consciência e vou aceitar a decisão da maioria. E lá vou sustentar que concordo com você: trata-se de abuso de poder de um juiz e que isso é um risco à democracia. Mas, com o coração aberto e triste, sinto que este escândalo é necessário, pois a vida tem me mostrado que a dor existe para que aprendamos.

    Oro para que, nos próximos movimentos deste xadrez político, os jogadores parem de sacrificar os peões – nós consumidores e eleitores - e após abaterem a rainha, (e tomarem o tão cobiçado trono)  deixem de abusar do povo, porque a nossa história apenas começou a ser escrita!

    Um beijo pra Heloise, pro Khauan e pra Estela. Saudades, meu amigo.


Flávio Ferreira (no papel de Professor, Acadêmico da AML e vice-presidente da OAB-MT)
 

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