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O Processo de impeachment à luz do Sistema Constitucional Brasileiro

Data: 08/10/2015 15:00

Autor: Felipe Amorim Reis

img Diante à má-gestão da Presidente da República no primeiro mandato, aliado ao escândalo de corrupção da Petrobras, bem como a retração da economia nacional, e às manobras e peladas fiscais, recentemente reprovadas pelo Tribunal de Constas da União, surgiram inúmeros questionamentos e aberturas de processos de impeachment contra a Presidente da República Dilma Rousseff.

A Constituição da República Federativa do Brasil preconiza em seu art. 85 que:

Art. 85. São crimes de responsabilidade os atos do Presidente da República que atentem contra Constituição Federal e, especialmente contra:
I – a existência da União;
II – o livre exercício do Poder Legislativo, do Poder Judiciário, do Ministério Público e dos Poderes constitucionais das unidades da Federação;
III – o exercício dos direitos políticos, individuais e sociais;
IV – a segurança interna do País;
V – probidade da administração;
VI – Lei orçamentária;
VII – o cumprimento das leis e das decisões judiciais.

Sobre a matéria, o Constitucionalista José Afonso da Silva  preleciona no sentido de que:

“No presidencialismo, o próprio Presidente é responsável, ficando sujeito a sanções de perda do cargo por infrações definidas como crime de responsabilidade, apurada em processo político-administrativo realizado pelas Casas do Congresso Nacional.”

Pois para o citado Professor,

“O Presidente da República poderá, pois cometer crimes de responsabilidade e crimes comuns, Estes definidos em legislação penal comum e especial”.

Neste contexto, é preciso distinguir crimes de responsabilidade, de crimes comuns.
Crimes comuns são aqueles tipificados pelo Código Penal Brasileiro e pela legislação penal-especial, ao passo que crimes de responsabilidade do Presidente da República, na realidade, não são crimes, por faltar-lhes antijuridicidade.

Portanto, concluí-se que os crimes de responsabilidade são definidos pela doutrina e jurisprudência como infração político-administrativa.

Nestes termos, o Professor Luiz Alberto David de Araújo  leciona no sentido de que:

“Somente os atos que caracterizam crimes de responsabilidade – que, como se disse, não são crimes propriamente ditos, mas infrações político-administrativas – podem provocar o impeachment.”

Para o referido Constitucionalista :

“A configuração de impeachment não viceja a existência de tipicidade e antijuridicidade, mas sim um juízo congressional de oportunidade e conveniência”.

No caso de julgamento de crimes de responsabilidade do Presidente da República, o juízo de admissibilidade do processo de impeachment será realizado pela Câmara dos Deputados (nos termos do art. 86 da CF/88), e o seu julgamento, consoante previsto no art. 52 da Carta Magna, será realizado pelo Senado Federal. Vejamos:

Art. 52 CF/88. Compete privativamente ao Senado Federal (EC n. 19/98, EC n. 23/99, EC n. 42/99, EC n. 42/2003 e EC n. 45/2004)

I – processar e julgar o Presidente da República e o Vice-Presidente da República nos crimes de responsabilidade, bem como os Ministros de Estado e os Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica nos crimes da mesma natureza conexos com aqueles;
(...)

Desta forma, o Excelso Supremo Tribunal Federal no julgamento de Agravo Regimental sobre o processo o impeachment do então Presidente Fernando Collor, já sedimentou o entendimento de que:

HABEAS CORPUS. IMPETRAÇÃO CONTRA DECISÃO PROFERIDA PELO SENADO FEDERAL EM PROCESSO DE IMPEACHMENT. PENA DE INABILITAÇÃO, POR OITO ANOS, PARA O EXERCÍCIO DE FUNÇÃO PÚBLICA.

E inidonea a via do habeas corpus para defesa de direitos desvinculados da liberdade de locomoção, como e o caso do processo de impeachment pela pratica de crime de responsabilidade, que configura sanção de indole político-administrativa, não pondo em risco a liberdade de ir, vir e permanecer do Presidente da Republica. Agravo regimental improvido.
(HC 70055 AgR/DF Distrito Federal. AG.REG. NO HABEAS CORPUS. Rel. Min. Ilmar Galvão. Julgamento 04/03/1993. DJ. 16-04-1993. Órgão Julgador: Tribunal Pleno).

Logo, os crimes de responsabilidade do Presidente da República e Ministros de Estado são definidos pela Lei Federal n. º 1.079, de 10 de Abril de 1950.

Consoante o art. 4º da aludida Lei Federal, recepcionada pela atual Constituição Federal, crimes de responsabilidades são definidos como:
Art. 4º São crimes de responsabilidade os atos do Presidente da República que atentarem contra a Constituição Federal, e, especialmente, contra:
I - A existência da União:
II - O livre exercício do Poder Legislativo, do Poder Judiciário e dos poderes constitucionais dos Estados;
III - O exercício dos direitos políticos, individuais e sociais:
IV - A segurança interna do país:
V - A probidade na administração;
VI - A lei orçamentária;
VII - A guarda e o legal emprego dos dinheiros públicos;
VIII - O cumprimento das decisões judiciárias (Constituição, artigo 89).
Por outro lado, em se tratando de prática de crime comum, previsto na legislação penal, este deverá ser julgado pelo Supremo Tribunal Federal, conforme o disposto no art. 86  da Constituição Cidadã de 1988.

É cediço que o forte esquema de corrupção denunciado pelo Ministério Público Federal envolvendo a Petrobras, por si só, se confirmado pelo Supremo Tribunal Federal, autorizará a abertura de processo por impeachment contra a Presidente da República, se assim entender o Congresso Nacional.

Nestes termos, o processo de impeachment não se trata de Golpe de Estado como alguns políticos situacionistas alegam na imprensa, e sim de processo constitucional devidamente previsto no sistema constitucional de 1988.

Sobre a problemática em questão do processo de impeachment da Presidente da República, o Eminente Constitucionalista Ives Gandra da Silva Martins  em parecer sobre o impeachment da Presidente da República Dilma Rousseff, assim concluiu:

“(...) A única questão formulada, entendendo que, apesar de ser um processo a ser analisado, mais política que juridicamente pelo Congresso Nacional, há elementos jurídicos para que seja proposto e admitido o ?impeachment? da atual presidente da República, Dilma Rousseff perante a Câmara dos Deputados e Senado Federal, pelos fundamentos expostos no presente parecer. E considero que o artigo 11 da Lei 8429/92, pela monumentalidade dos desvios de dinheiro público por anos, é mais do que suficiente para fundamentá-lo, independentemente dos que entendam que sua extensão é excessiva. Concluo, pois, considerando que o assalto aos recursos da Petrobrás, perpetrado durante oito anos, de bilhões de reais, sem que a Presidente do Conselho e depois Presidente da República o detectasse, constitui omissão, negligência e imperícia, conformando a figura da improbidade administrativa, a ensejar a abertura de um processo de ?impeachment. S.M.J.”

Ademais, é importante destacar que a renúncia da Presidente da República, ante o recebimento do processo de impeachment, não suspenderá o processamento do impeachment no Congresso Nacional.

Com efeito, entendo que os atos de corrupção da Presidência da República perpetrados desde a “era do Mensalão”, surgem na contrapartida dos preceitos e sistema constitucional em vigor, uma vez que o próprio conceito de democracia é justamente respeitar as regras constitucionais do sistema posto e promulgado por representantes eleitos democraticamente pelo povo.

Assim sendo, torna-se clarividente que tais atos de corrupção ferem de morte a supremacia da Constituição Federal 1988 e os princípios elencados no art. 37 da Carta Magna, tais como: da legalidade, da eficiência, da impessoalidade e da moralidade, bem como o Estado de Direito em vigor.

A guisa do exposto, concluí-se que em razão dos atos de improbidade administrativa e do desgoverno da atual Presidência da República, se caso confirmados a prática de crimes de responsabilidades e/ou crimes comuns, tal como o crime de responsabilidade fiscal, deverá o Congresso Nacional, como legítimo representante do povo, à luz do parágrafo único do art.1º da Constituição Federal, decretar o impeachment da Presidente da República Dilma Rousseff.

Felipe Amorim Reis é advogado, especialista em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários, especialista em Direito Constitucional pela Fundação Escola Superior do Ministério Público de MT, Pós-graduado em Direito Processual Civil pela mesma Fundação e Presidente da Comissão de Estudos Constitucionais da OAB/MT.

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[1] José Afonso da Silva. Curso de Direito Constitucional Positivo. Malheiros Editores - 33ª Edição Revista e atualizada (até a Emenda Constitucional n. 62, de 9.11.2009, publicada em 12.12.2009 com adendo das EC ns. 63 e 64/2010) p. 550.

[2] Luiz Alberto David de Araújo  e Vidal Serrano Nunes Júnior. Curso de Direito Constitucional. Ed. Verbatim 17ª  Edição atualizada até a EC n. 71 de 29 de novembro de 2009. E

[3] Idem.

[4] Reza o art. 86 da Constituição Federal de 1988 o seguinte: “Admitida a acusação contra o Presidente da República, por dois terço da Câmara dos Deputados, será ele submetido a julgamento perante o Supremo Tribunal Federal, nas infrações penais comuns, ou perante ao Senado Federal, nos crimes de responsabilidade”.

[5] Professor Emérito das Universidades Mackenzie, UNIP, UNIFIEO, UNIFMU, do CIEE/O ESTADO DE SÃO PAULO, das Escolas de Comando e Estado-Maior do Exército - ECEME, Superior de Guerra - ESG e da Magistratura do Tribunal Regional Federal – 1ª Região; Professor Honorário das Universidades Austral (Argentina), San Martin de Porres (Peru) e Vasili Goldis (Romênia); Doutor Honoris Causa das Universidades de Craiova (Romênia) e da PUC-Paraná, e Catedrático da Universidade do Minho (Portugal); Presidente do Conselho Superior de Direito da FECOMERCIO - SP; Fundador e Presidente Honorário do Centro de Extensão Universitária - CEU/Instituto Internacional de Ciências Sociais - IICS. 64 Parecer publicado em 26.01.2015 no site http://s.conjur.com.br/dl/parecer-ives-gandra-impeachment.pdf acessado em 02 de março de 2015 às 15 horas.

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