Publicada recentemente pelo Município de Cuiabá os decretos n. 9.608/2023 e 9.609/2023 que visam autualizar monetariamente o Imposto Predial Territorial Urbano (IPTU) do calendário vigente do ano de 2023.
O IPTU, conforme preconizado pelo inciso I do art. 156 da Constituição Federal é de competência municipal a sua instituição, fiscalização e cobrança.
O aspecto nuclear da incidência desse imposto é a propriedade predial e territorial urbana e tem como fato gerador a propriedade, o domínio útil ou a posse de bem imóvel por natureza ou por acessão física, como definido na lei civil, localizado na zona urbana do Município consoante disposto no artigo 32 do Código Tributário Nacional.
No tocante aos decretos municipais que aumentaram o imposto em voga, é patente a sua inconstitucionalidade formal e material, à luz do sistema constitucional em vigor.
Pois, é cediço que toda criação ou majoração de tributos deve ser previsto por lei em sentido estrito.
Nestes termos:
“Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
I - exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça;
II - instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente, proibida qualquer distinção em razão de ocupação profissional ou função por eles exercida, independentemente da denominação jurídica dos rendimentos, títulos ou direitos.”
Assim sendo, conforme disposto no inciso I do artigo 150, onde vige o princípio da legalidade tributária, qualquer criação ou aumento de tributo só pode ser feito por meio de lei aprovada pelo parlamento, no caso, a Câmara de Vereadores.
O Supremo Tribunal Federal em completa harmonia com o posicionamento do Superior Tribunal de Justiça e em reiterados precedentes endossa tal entendimento a respeito do tema
(...) III – Essa Corte, no julgamento de feito com repercussão geral reconhecida, RE648.245/MG, Rel. Min. Gilmar Mendes, reiterou seu entendimento no sentido de que, com base no princípio da reserva legal (art. 150, I, da CF), somente por lei em sentido formal é possível instituir, alterar ou majorar a base de cálculo do IPTU, cabendo apenas sua atualização por meio de decreto, desde que em patamar inferior aos índices inflacionários oficiais de correção monetária. (...)
Ademais, impende registar que os aludidos decretos municipais contrariam o princípio da anterioridade tributária prevista na alínea b do inciso III do art. 150 da Constituição Federal que veda a cobrança de tributos em relação a fatos geradores ocorridos no mesmo exercício financeiro em que foi criado, logo só poderá ser cobrada no ano de 2024.
Nestes termos:
“ Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
(...)
III - cobrar tributos:
a) em relação a fatos geradores ocorridos antes do início da vigência da lei que os houver instituído ou aumentado;
b) no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou;
(...).
Assim sendo, conforme previsto no artigo 1º do aludido decreto municipal publicado no dia 22 de abril de 2023, o IPTU do ano de 2023 “será lançado a partir do dia primeiro de março de 2023, em cota única, ou em até oito (8) parcelas mensais e consecutivas”.
Extrai do comando positivado no decreto municipal, que o imposto predial territorial rural está sendo cobrado de forma retroativa, de modo a desrespeitar os princípios da irretroatividade da leis tributárias, da segurança jurídica, do princípio da legalidade e da anterioridade tributária todos plasmados no texto constitucional em vigor.
A guisa do exposto, conclui-se que o Município de Cuiabá tenta cobrar o IPTU por vias transversas, tendo em vista a decisão já firmada pelo Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso que acertadamente confirmou a inconstitucionalidade da majoração do IPTU do ano de 2023.
FELIPE AMORIM REIS é advogado, Especialista em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários. Especialista em Direito Constitucional pela Fundação Escola Superior do Ministério Público de Mato Grosso e especialista em Direito Processual Civil pela mesma instituição. Ex-conselheiro do Conselho de Contribuintes da SEFAZ/MT e Presidente da Comissão de Estudos Constitucionais da OAB/MT.