E todas as vezes, temos visto uma mulher a menos, uma amiga, uma irmã, uma mãe, uma pessoa inocente a menos.
Nenhuma a menos é uma frase que movimentos pelos direitos das mulheres utilizam para simbolizar o que não podemos admitir: a perda de uma mulher para a violência.
Para simbolizar que nós estamos atentas umas às outras, como companheiras, sucetíveis ao menos tipo de crimes e discriminações.
Mas temos muitas a menos. Perdemos muitas para o feminicídio e tantos outros males que atingem as mulheres como grupo social.
Mas já passou da hora da outra metade da humanidade se conscientizar, e vir para o lado de quem exige nenhuma a menos.
A modificação estrutural só ocorrerá com o engajamento de toda a sociedade. Especialmente os homens, cuja principal missão hoje é a de refletir acerca do que seja, para ele mesmo, a sua masculinidade.
Não sou partidária do termo masculinidade tóxica. Muito embora ela exista, no abuso, na violência, no preconceito, no menosprezo da capacidade feminina…. Sentimentos e situações que levam à despersoniificação das mulheres que com ele convivem, ferindo, muitas vezes à ponto de matar.
Sou partidária de que os homens - especialmente os que se propõem à uma nova e melhor convivência com as mulheres, reflitam sobre si mesmos. A ponto de detectarem se não vinculam a fidelidade de suas parceiras (por exemplo) à sua essência de ser homem (como boa parte dos feminicidas). Que reflitam sobre si mesmos, para verificarem se não vinculam a ideia de sentirem-se menos homens, em caso de fim de relacionamento, se têm capacidade de perceber que sua vida continua integra, mesmo que sua mulher desejar o fim.
Para tanto, devemos incentivar a existência dos grupos reflexivos, de homens, para que entre si reflitam e se tornem independentes de preconceitos herdados. Tarefa para o Poder Público que já vem pondo em prática no Poder Judiciário e aqui em Mato Grosso na PM, é tarefa para as empresas, que podem ganhar muito com o fim do assédio e em produtividade, num ambiente mais saudável.
A cada uma mulher vítima de feminicídio, observo pessoas consternadas, mas muitas ainda em negação do termo, e da óbvia repetição das mesmas características do crime.
Sem conscientização não haverá mudança.
Observo o Poder Judiciário e o Poder Executivo, por meio da segurança pública e assistência social, discutindo, aperfeiçoando e modificando cada fase de atendimento após a denúncia. Isso é necessário. Mas é preciso atacar a raiz cultural.
Esse crime se baseia em preconceito histórico quanto aos papéis de homem e mulher. Atinge ricos e pobres. Cultos e sem conhecimento formal. Perpassa religiões, indiferente à cor.
E destrói famílias. Lutamos para socorrer os órfãos do feminicídio.
É preciso nos comprometer em atacar a causa.
Nenhuma a menos.
Mas só ontem em Mato Grosso, foram duas mulheres a menos.
* Glaucia Amaral é presidente da Comissão da Mulher Advogada da Ordem dos Advogados do Brasil - Seccional Mato Grosso (OAB-MT)