Estudos revelam que o Brasil registrou, em 2020, o maior patamar de letalidade policial já observado desde 2013, quando o Fórum Brasileiro de Segurança Pública começou a monitorar o indicador. Os agentes de segurança pública são responsáveis por 12,8% do total de mortes violentas no país
A par disso, atualmente o uso de câmeras corporais está em ascensão por diversos países no mundo, mas ainda carece de estudos de campo e bases científicas. Os resultados nem sempre são documentados, e faltam, na literatura nacional, pesquisas específicas sobre o tema. Nesse ínterim, é importante a colaboração deste estudo para que haja subsídio científico para apoiar e estimular o uso desse equipamento aqui em Mato Grosso, que vem demonstrando eficácia na redução do uso progressivo da força por parte dos policiais em outros Estados que vêm se utilizando dessa importante ferramenta.
As ações operacionais não só da Polícia Militar, como outras, constantemente são alvos de diversas críticas e até mesmo de denúncias à Corregedoria e ao Ministério Público, pois muitas vezes tais ações estão eivadas de ilegalidades, excessos e arbitrariedades, recentemente sofrida pelo advogado Orcelio Ferreira Silverio Junior, de 32 anos pela Polícia Militar em Goiânia.
Paradoxalmente, é inegável a importância dessas ações não só na coibição criminal ou repreensão, mas também em seu caráter probatório para o processo penal, afinal, o testemunho policial produzirá prova em juízo, isto porque, em tempos do sistema virtual pelo Poder Judiciário, simplesmente fácil à colação de vídeos – filmagens nesse sentido, para coibir tão somente as palavras dos policiais em seus depoimentos.
Nesse contexto, o uso de câmeras individuais torna a atividade probatória mais eficaz e acaba por realizar também um tipo de controle da atividade policial ao fazer seu monitoramento, constituindo em mais um elemento de garantia dos direitos individuais, pois tornam a ação policial eficiente, reduzindo os excessos e abusos no uso da força progressiva e até mesmo a necessidade de sua utilização.
Assim, é imprescindível buscar-se ferramentas que possam tornar eficiente à atuação policial, ainda mais se um recurso propicia concomitantemente controle interno da polícia, efetividade probatória, redução de recursos disponibilizados para apuração de denúncias contra policiais, dados para gestão de informação operacional, meios de treinamento por meio da análise posterior das atuações policiais.
O uso da força pode ser considerado legítimo e é previsto em protocolos policiais em determinadas circunstâncias. As câmeras podem servir como solução tecnológica para aumentar o escrutínio e a supervisão sobre a tropa, que sempre passam despercebidos aos olhos da sociedade em desastrosas operações policiais, eis que a sua presença servirá para mitigar eventuais escaladas de violência nas interações entre os policiais e os cidadãos.
Não há dúvida, que implementar câmeras pode ser um passo importante em direção à redução do uso excessivo da força pela polícia. Mas para assegurar que as câmeras são eficientes é importante considerar incentivos de carreira que existem para policiais. Se os agentes estão preocupados com a progressão da carreira, é mais provável que eles ajustem a conduta ao protocolo, temendo possíveis repercussões.
Não obstante, não temos a ingenuidade de pensar que as câmeras corporais, sozinhas, vão mudar a atitude da polícia. Hoje, é difícil termos acesso até aos números da violência letal, crimes que são obrigatoriamente registrados na polícia. Imagine como seria com as imagens das câmeras dos policiais em situações questionáveis ou duvidosas.
Embora seja um ativo poderoso, esse tipo de tecnologia não vai resolver sozinha todos os problemas de violência e insegurança. Ela precisa vir acompanhada de regras claras de coordenação, supervisão e principalmente, ética sobre seu impacto social.
Por fim, isso sugere que a redução de eventos negativos entre policiais e cidadãos é impulsionada principalmente por mudanças no comportamento do policial, mais do que por mudanças de conduta dos cidadãos quando em presença da câmera, em especial dos próprios policiais, antes acostumados a manipulações e intervenções violentas, agora precisam ter condutas que correspondam ao caráter público do serviço que prestam.
* José Ricardo Costa Marques Corbelino é advogado e membro da ABRACRIM