A luta incansável pela conquista e efetivação dos direitos das mulheres surgiu, como marco histórico e normativo, durante as últimas décadas do século XIX, na Inglaterra. Na ocasião, grupos de mulheres, também conhecidas como sufragetes¹, se organizaram para lutar por seus direitos, especialmente, em busca do direito ao voto.
O Dia Internacional da Mulher passou a ser comemorado a partir do ano de 1911, instituído em memória ao homicídio de 129 mulheres operárias, ocorrido no dia 08 de março de 1857, numa fábrica têxtil em Nova Iorque (EUA), que reivindicavam a redução da jornada de trabalho e o direito à licença-maternidade.
Muitas vezes incompreendido, talvez por desconhecimento acerca do seu real objetivo, o movimento feminista foi a mola propulsora que permitiu às mulheres conquistas de direitos sonegados durante séculos. A premissa de que os direitos são fruto de luta e reivindicação social esbarram nos ensinamentos trazidos por Hannah Arendt², por meio da emblemática frase “a essência dos Direitos Humanos é o direito a ter direitos”.
A ideia emanada por Arendt se traduz na crítica ao universalismo dos direitos humanos, na medida em que o direito a ter direitos não é suficiente e, portanto, a conquista de um direito carece de sua real efetivação. A partir dessa ideia, compreende-se que a luta pelos direitos das mulheres, na condição de direito humano, deve ser constante.
Desde a conscientização e luta do movimento feminista por maiores direitos às mulheres, muito se avançou e conquistou, tanto no cenário internacional, quanto no nacional. Alguns documentos internacionais podem ser considerados diretrizes no que se diz respeito à busca pela legitimação e proteção dos direitos das mulheres, sendo eles a Convenção Interamericana sobre a Nacionalidade das Mulheres adotada pela Organização dos Estados Americanos (OEA) no ano de 1933; a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres (CEDAW), em 1979; a Declaração sobre a Violência contra a Mulher, aprovada pela Organização das Nações Unidas (ONU), em 1993; e a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir, Erradicar a Violência contra a Mulher (também conhecida como Convenção de Belém do Pará), aprovada pela OEA em 1994.
Adentrando aos reflexos dos avanços da luta pelos direitos das mulheres no Brasil, temos como principais marcos a conquista do direito ao voto eleitoral no Brasil, em 1934; a criação da primeira Delegacia da Mulher, na cidade de São Paulo, em 1985; em 1990, constatou-se o aumento expressivo de Organizações Não Governamentais (ONG’s) e serviços de atendimento da mulher; no ano de 1997, foi sancionada a Lei nº 9.504/1997, que estabelece normas eleitorais, dentre elas a obrigatoriedade de mínimo de 30% e o máximo de 70% para candidaturas de cada sexo.
Em 07 de agosto de 2006 foi sancionada a Lei nº 11.340/2006, denominada Lei Maria da Penha³, criada para combater a violência doméstica contra a mulher. O apontado texto normativo aumentou o rol quanto aos tipos penais de violência praticados contra a mulher, incluindo, além da agressão física, as violências psicológica, sexual, patrimonial e/ou moral, sendo, portanto, considerado um avanço histórico-normativo na proteção à integridade da mulher em um contexto amplo; em 2015 foi sancionada a Lei nº 13.104/2015, a qual instituiu o feminicídio como um dos tipos de homicídio qualificado, listado no art. 121, IV, §2º-A e §7º do Código Penal brasileiro.
No ano de 2009, a Lei Joanna Maranhão (Lei nº 6.719/2009), sancionada em 2015, foi responsável por alterar os prazos de prescrição de crimes sexuais cometidos contra crianças e adolescentes. Em 2012, criou-se a Lei Carolina Dieckman (Lei nº 12.737/2012), que promoveu alterações no Código Penal envolvendo a definição de crimes cibernéticos. No ano seguinte, foi publicada a Lei do Minuto Seguinte (Lei nº 12.842/2013), responsável por prever garantias às vítimas de violência sexual, como, por exemplo, atendimento imediato pelo SUS e atendimento psicológico às vítimas.
Recentemente, em 14 de dezembro de 2020, as mulheres advogadas conquistaram a aprovação da implementação da paridade de gênero nas eleições gerais da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Essa conquista se traduz na obrigatoriedade de que metade das chapas que disputarem as eleições, em qualquer instância da OAB, deverão ser compostas por 50% de mulheres.
Apesar dos avanços e conquistas, muito há que se alcançar, a exemplo da equidade salarial, uma vez que a diferença salarial entre os gêneros chega a quase 53%, entre os cargos, áreas de atuação e
níveis de escolaridade. Outro fato considerável é que ainda somos minoria ocupando os cargos de gestão, diretoria e cargos políticos (Legislativo e Executivo).
Não nos esqueçamos de todas as lutas travadas até o presente momento, de todas as mulheres e conquistas alcançadas. Lutar incansavelmente pela efetivação dos nossos direitos e pela igualdade de gênero, em todas as instâncias e setores da sociedade, é honrar um passado de conquistas e traçar um futuro justo para as próximas gerações.
* Têmis Francischini Fagundes Espósito, Advogada, Membro da Comissão de Direito Internacional da OAB/MT, Mestra em Ciências Jurídico-Internacionais pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa (FDUL), Especialista em Ciências Jurídico-Internacionais pela Universidade de Lisboa e Pós-graduanda em Compliance e Integridade Corporativa pela PUC-MG.
** Patrícia Camila Fraga, Advogada, Secretária-Geral da Comissão de Direito Internacional da OAB/MT, Mestranda em Direito Agroambiental pela Faculdade de Direito da Universidade Federal de Mato Grosso, Especialista em Direito e Comércio Internacional pela Rede Luís Flávio Gomes.
[1] A denominação sufragete é oriunda do movimento sufragista em comento, liderado por mulheres, na busca por igualdade e combate à desigualdade de gênero.
[2] ARENDT, Hannah. Origens do Totalitarismo – Antissemitismo, Imperialismo, Totalitarismo. Trad. Roberto Raposo. São Paulo: Companhia das Letras, 1989, p. 332.
[3] A Lei Maria da Penha é um reflexo da responsabilização do Estado brasileiro, pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), em razão de sua omissão, negligência e tolerância aos atos de violência perpetrados contra Maria da Penha, vítima de violência doméstica.